ARTIGO CIENTÍFICO

Hambúrguer bovino com substituição da gordura por farinha da casca de maracujá

Beef burger with substitution of fat by flour of passion fruit peel

Letícia Dias dos Anjos Gonçalves1; Gabriella Leite Magalhães2

1Mestre em Ciência dos Alimentos. Universidade Federal do Triângulo Mineiro. Uberaba, Minas Gerais. (34) 3331 3217. leticiauftm@gmail.com; 2Bacharel em Engenharia de Alimentos. Universidade Federal do Triângulo Mineiro. Uberaba, Minas Gerais. (34) 3331 3217. gabriella-leitem@hotmail.com

Recebido para publicação em 19/05/2018; aprovado em 18/09/2018

RESUMO: O consumo de hambúrguer atrai o consumidor devido ao baixo custo, facilidade e rapidez no preparo e consumo. A presença de gordura convencionalmente faz parte deste produto, sendo responsável por contribuir com cor, sabor e textura. Devido preocupação cada vez mais recorrente dos consumidores com alimentação saudável, saúde e bem-estar, nota-se a busca por alimentos com baixas calorias e reduzido teor de gordura. Nessa perspectiva o presente estudo teve como proposta a elaboração de hambúrguer bovino com substituição total e parcial (50%) da gordura por farinha da casca de maracujá. Foram testadas as características físico-químicas, como umidade, extrato etéreo, proteína, capacidade de retenção de água, rendimento de cocção, percentual de encolhimento e perfil de textura do produto. Nos hambúrgueres em que a gordura foi substituída, obteve-se melhoria no rendimento de cocção e redução no teor de encolhimento. Em relação às análises de umidade, extrato etéreo e proteína, os tratamentos estavam de acordo com o estabelecido pela legislação. Na análise de perfil de textura, não foi verificada diferença das amostras em relação ao tratamento padrão, para os atributos dureza, elasticidade e mastigabilidade. Assim, foi possível a obtenção de um produto mais saudável, atendendo as expectativas dos consumidores, com boas características físico-químicas e de acordo com os padrões legais.

Palavras-chave: Produto cárneo; Redução de gordura; Fibra; Saudável.

ABSTRACT: The consumption of hamburger attracts the consumer due to the low cost, easiness and rapidity in the preparation and consumption. The presence of fat conventionally is part of this product, being responsible for contributing with color, flavor and texture. Due to the increasingly recurrent concern of consumers with healthy eating, health and well-being, one notices the search for foods with low calories and reduced fat content. In this perspective, the present study had as proposal the elaboration of bovine hamburger with total and partial replacement (50%) of the fat per flour of the passion fruit peel. Physical-chemical characteristics such as moisture, ethereal extract, protein, water retention capacity, cooking yield, percentage of shrinkage and texture profile of the product were tested. In the burgers in which the fat was replaced, improvement in cooking yield and reduction in shrinkage content was obtained. In relation to the analyzes of moisture, ethereal extract and protein, the treatments were in accordance with the established by the legislation. In the analysis of texture profile, no difference of the samples was verified in relation to the standard treatment, for the attributes hardness, elasticity and chewing. Thus, it was possible to obtain a healthier product, meeting the expectations of consumers, with good physicochemical characteristics and in accordance with legal standards.

Keywords: Meat product; Fat reduction; Fiber; Healthy food.

INTRODUÇÃO

Conveniência no processo de aquisição e no consumo de alimentos é algo cada vez mais valorizado, fato evidenciado pelo estilo de vida das pessoas. Segundo dados do IBGE, entre 2000 e 2010, o percentual de pessoas que residem sozinhas subiu de 9,2% para 12,1%, público que procura facilidade na hora do preparo das refeições e por alimentos comercializados em pequenas porções, no caso de porções individuais. Isso acarreta consumo elevado de refeições pré-cozidas, fast foods e lanches, sendo, portanto, consumidos alimentos com maior energia, gorduras saturadas e colesterol (POPKIN, 2006). A ingestão desses tipos de alimentos leva à obesidade, além de associação com alguns tipos de câncer, altas taxas de colesterol no sangue, hipertensão e doença cardíaca coronária (KHALIL, 2000). Conforme dados apresentados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2010 17,8% da população brasileira era obesa; em 2014, o índice chegou aos 20%. Para conter esse aumento é necessário promover a escolha de alimentos saudáveis (PAN AMERICAN HEALTH ORGANIZATION, 2015), sem perder de vista a praticidade no consumo.

O consumo de hambúrgueres se destaca por trazer essa praticidade, pois, em geral, esse tipo de produto contém até 30% de gordura (BASTOS et al., 2014). Entretanto, a busca por uma alimentação saudável faz com que os consumidores procurem por produtos que aliem saúde ao prazer de um alimento palatável. Esse perfil de consumidores impulsiona o desenvolvimento de produtos com redução substancial de gordura, sem prejuízo ao seu sabor e à sua qualidade (FORKER et al., 2012). Nesse aspecto, as comunidades, industrial e científica, vêm investindo no desenvolvimento de novos produtos para que, além de atenderem a essa demanda, possam oferecer benefícios à saúde do consumidor (OLIVEIRA et al., 2013).

Por conta disso, alguns trabalhos substituindo gorduras em produtos cárneos têm sido feitos. Adição de celulose amorfa como substituto de gordura em produto cárneo emulsionado aumentou à estabilidade da emulsão e a consistência, além de melhorar a textura (SCHMIELE et al., 2015). A adição de farinha de linhaça como substituto parcial de gordura saturada em hambúrguer de carne bovina proporcionou maior rendimento, menor encolhimento após cocção, aumento dos níveis de ácidos graxos poli-insaturados e redução de ácidos graxos saturados (OLIVEIRA et al., 2014).

Nesse sentido, pensou-se na utilização da farinha da casca de maracujá como substituto de gordura em produto cárneo, visto que foram encontradas apenas aplicações dessa substituição em trabalhos na área de panificação. Silva e Roncari (2015) utilizaram a farinha da casca do maracujá como substituto da farinha de trigo na fabricação de pão de mel, obtendo produtos aceitáveis pelos consumidores e com composições químicas e propriedades físicas semelhantes ao produto tradicional. Estudo de bolos enriquecidos com farinha da casca do maracujá encontrou boa aceitação sensorial, também equivalente aos produtos tradicionais (MIRANDA et al., 2013).

A farinha da casca do fruto de maracujá possui elevado teor de fibras alimentares (66,37%), destacando-se o fato de apresentarem boa capacidade de absorção de água (6,02 g água/g de amostra seca) quando comparada às fibras de farelo de casca de milho (3,1702 g água/g de amostra seca), farelo da casca de trigo (2,9102 g água/g de amostra seca) e farelo da casca de soja (1,4902 g água/g de amostra seca) (SOUZA et al., 2008).

Ressalta-se que o aproveitamento da casca de maracujá ainda envolve a questão de sustentabilidade ambiental, visto que as agroindústrias geram cada vez mais resíduos para o meio ambiente, com destaque para casca, caroço, sementes e bagaço, dependendo do tipo da fruta e do processo (SOUZA et al., 2011). No caso do maracujá, 52% do peso da fruta corresponde apenas a casca (CÓRDOVA et al., 2005), ou seja, a parte descartada é maior do que a parte a ser consumida.

Nesse âmbito, este trabalho objetivou desenvolver uma opção saudável de hambúrguer com substituição parcial e total do teor de gordura por farinha da casca de maracujá e analisar as características tecnológicas e a adequação legal desse novo produto.

MATERIAL E MÉTODOS

A condução de todo experimento se deu no Laboratório de Desenvolvimento de Produtos, F5, do Instituto de Ciências Tecnológicas e Exatas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro.

Foram desenvolvidas três formulações de hambúrgueres, respeitando o Padrão de Identidade e Qualidade (PIQ) para esse produto (IN 20, de 31 de julho de 2000). Uma formulação controle, sem adição de farinha da casca de maracujá, uma com substituição de 50% da gordura por farinha da casca de maracujá e outra com substituição total da gordura por farinha da casca de maracujá. Na Tabela 1, são apresentadas as formulações que foram desenvolvidas.

Tabela 1. Formulações dos hambúrgueres sem substituição de gordura e com substituições de 50% e 100% da gordura por farinha da casca de maracujá

Ingredientes em % p/p

Ingredientes

Padrão

50% de substituição

100% de substituição

Massa Cárnea




Paleta ou acém bovino

45

45

45

Peito bovino

45

45

45

Gordura bovina

10

5

-

Ingredientes em relação à massa




Água gelada

15

15

15

Sal refinado

2

2

2

Proteína texturizada de soja

4

4

4

Glutamato monossódico

0,2

0,2

0,2

Polifosfatos

0,5

0,5

0,5

Fixador Ibracor LF 604/4*

0,5

0,5

0,5

Farinha casca de maracujá

-

1

2

Condimentos




Alho em pó

0,20

0,20

0,20

Pimenta do reino

0,10

0,10

0,10

Cebola em pó

0,15

0,15

0,15

Fonte: Adaptado de Ramos (2005). *açúcar + ácido eritórbico + ácido cítrico

As carnes e a farinha da casca de maracujá foram adquiridas em comércio local na cidade de Uberaba/MG.

A carne e a gordura foram moídas em disco de 5mm, intercalando a carne e a gordura durante a moagem. Os ingredientes secos foram misturados após a moagem durante 6 minutos, os hambúrgueres foram moldados com um auxílio de molde manual de 11 cm de diâmetro e 1,5 cm de altura para padronização. Cada unidade foi envolta em plásticos de polietileno e congeladas por volta de -18°C até a realização das análises (~ 48 horas).Os hambúrgueres crus foram submetidos às análises de umidade por secagem em estufa à 105°C até peso constante (AOAC, 1990); extrato etéreo pelo método de extração à quente Soxhlet, utilizando éter de petróleo como solvente conforme AOAC (1990) e proteína pelo método de Kjeldahl conforme AOAC (1995).

Foram tomadas também medidas para determinação do rendimento de cocção e porcentagem de encolhimento conforme Berry (1997). Para determinação do rendimento de cocção após descongelamento a 4°C por 12 horas os hambúrgueres foram aquecidos em chapa elétrica a 150°C por 14 minutos (7 min de cada lado) até alcançarem temperatura interna de 72°C, controlada com uso de termopar. O percentual de rendimento foi calculado pela diferença entre o peso da amostra crua e cozida, de acordo com equação 1. A porcentagem de encolhimento foi determinada através equação 2.


A capacidade de retenção de água foi determinada de acordo Troy, Desmond e Buckey (1999). Foram tomadas amostras de hambúrguer pesando por volta de 5g, e essas foram centrifugadas a 4000 rpm por 10 mim em centrífuga modelo 206 BL/ Excelsa I e após esse procedimento foram pesadas. A Capacidade de Retenção de Água (CRA) foi determinada de acordo com a equação 3.

Em que: A = peso da amostra (g) crua; D = peso da amostra em (g) crua após a centrifugação e U = total de água da amostra % (baseada na umidade do hambúrguer).

Realizou-se também Texture Profile Analysis (TPA – Análise do Perfil de Textura) a partir dos hambúrgueres cozidos. De cada amostra, foram retiradas porções de dois locais diferentes, as quais foram cortadas com disco de 33mm. O TPA foi realizado em um texturômetro TA.XT Plus da Stable Micro Systems. As amostras foram comprimidas duas vezes para 25% de sua altura original, com velocidade pré-teste 1,0 mm/s, teste de 2,0 mm/s e pós-teste de 5,0 mm/s. Utilizou-se o probe cilindro de alumínio com 35 mm de diâmetro para realizar a compressão.

Foram realizadas três repetições em triplicata para cada uma das análises, e em cada repetição foram formulados diferentes lotes de hambúrgueres. Para verificar o efeito das formulações sobre os parâmetros analisados, foi realizada análise de variância dos dados e, para comparação de médias, o teste de Tukey (p>0,05), utilizando o software Statistica 8.0.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Tabela 2 apresenta os resultados de média e desvio padrão das análises de composição centesimal para os diferentes tratamentos.

Tabela 2. Umidade, extrato etéreo na matéria integral e proteína na matéria integral para os diferentes tratamentos de hambúrguer.

Tratamento

Umidade (%)

Extrato etéreo (%)

Proteína (%)

Padrão*

67,40±2,18 b

9,02±1,72 c

20,38±4,7 a

50%*

71,26±0,93 a

4,76±0,58 b

18,17±0,85 a

100%*

72,56±0,46 a

1,03±0,96 a

17,70±0,55 a

*Padrão: formulação sem adição de farinha da casca de maracujá, 50%: formulação com substituição de 50% da gordura bovina por farinha da casca de maracujá, 100%: formulação com substituição total da gordura por farinha da casca de maracujá. Médias seguidas de mesma letra na mesma coluna não diferem pelo teste de Tukey (p<0,05).

Observa-se pela Tabela 1 aumento significativo (p < 0,05) na umidade dos hambúrgueres adicionados de farinha da casca de maracujá. Oliveira et al. (2014), ao avaliar a substituição de gordura em hambúrguer por farinha de linhaça dourada, também relataram aumento da umidade quando a farinha foi adicionada. Seabra et al. (2002) também observaram aumento significativo na umidade de hambúrgueres que tiveram a gordura substituída por farinha de aveia e fécula de mandioca, sendo que nestes a umidade ficou em torno de 76%, resultado próximo ao encontrado no presente trabalho.

No que se refere ao extrato etéreo, todos os tratamentos diferiram (p<0,05) entre si. Observou-se que quanto maior a adição de fibra menor o teor de lipídeo, fato que comprova o propósito de redução de gordura do estudo. Segundo a Instrução Normativa n° 20, a quantidade máxima de gordura permitida no hambúrguer é de 23%, estando os valores encontrados de acordo com essa regulamentação (BRASIL, 2000). Ressalta-se que a rotulagem do hambúrguer com farinha de casca de maracujá poderá vir com o atributo “baixo” quando tiver no máximo 3% de gordura total (BRASIL, 2012), portanto o tratamento de 100% poderá ser considerado um produto de baixo teor de gordura. Vale mencionar o fato de que a produção desses hambúrgueres com redução do teor de gordura além de poder atender um público que busca alimentos mais saudáveis, poderá direcionar a gordura bovina que deixará de ser utilizada para outros mercados, desde os mais tradicionais como o de sabão, cosméticos e ração até mesmo como insumo na fabricação de biodiesel (LEVY, 2011).

Quanto ao teor de proteína, os tratamentos não diferiram entre si (p<0,05). Segundo o padrão de identidade e qualidade de hambúrgueres, o mínimo estabelecido para a proteína é de 15%, estando todas as amostras de acordo com o valor especificado pela legislação brasileira (BRASIL, 2000). A faixa de valores encontrada para proteínas neste trabalho (17,7 a 20,38%) é semelhante a encontrada por Oliveira et al. (2014), de 18,81 a 20,45%, que trabalharam com os mesmos níveis de substituição (50 e 100%) da gordura do hambúrguer bovino por farinha de linhaça dourada.

A Tabela 3 apresenta a média e o desvio padrão para as propriedades físicas: CRA, rendimento de cocção e porcentagem de encolhimento para os hambúrgueres padrão e adicionados de farinha da casca de maracujá.

Tabela 3. Capacidade de retenção de água, rendimento de cocção e porcentagem de encolhimento para os diferentes tratamentos de hambúrguer.

Tratamento

Capacidade de retenção de água (CRA) (%)

Rendimento de cocção (%)

Encolhimento (%)

Padrão*

53,95±9,64 b

75,02±8,02 b

22,76±4,64 b

50%*

61,63±7,45 ab

81,39±2,5 a

10,43±1,82a

100%*

64,29±2,99 a

84,82±1,45 a

8,22±1,37 a

*Padrão: formulação sem adição de farinha da casca de maracujá, 50%: formulação com substituição de 50% da gordura bovina por farinha da casca de maracujá, 100%: formulação com substituição total da gordura por farinha da casca de maracujá. Médias seguidas de mesma letra, na mesma coluna, não diferem pelo teste de Tukey (p>0,05).

Para a CRA, observa-se que houve diferença significativa apenas entre o tratamento padrão e o tratamento com substituição de 100% do teor de gordura, constatando-se que a substituição total da gordura pela farinha da casca de maracujá aumentou a capacidade de retenção de água. Esse aumento na CRA é devido à pectina da casca de maracujá, a qual constitui a fração solúvel de fibra e que apresenta alta capacidade de retenção de água formando géis em solução aquosa (CORDEIRO, 2011). Isso explica também o aumento do teor de umidade observado.

Quando comparados a outros trabalhos com outras fontes de fibra, mas que substituem as gorduras no hambúrguer, os valores deste trabalho são um pouco menores. Oliveira et al. (2014) reportam valores para CRA na faixa de 64,65% a 70,77% e Bernadino Filho et al. (2012) de 69,83 a 72,44%, porém nota-se a concordância de que sempre nas formulações com maiores níveis de substituição de gorduras por algumas fontes de fibras, os valores da CRA tendem a ser maiores.

Em relação ao rendimento de cocção e ao encolhimento, observa-se diferença significativa dos tratamentos com adição de farinha de casca de maracujá para o tratamento padrão, logo a substituição da gordura contribuiu para se obter um melhor rendimento na cocção e menor encolhimento das amostras. Outros autores observaram mesma relação. Bernadino Filho et al. (2012) analisaram a formulação de hambúrguer adicionado de inulina como substituto de gordura e observou maior rendimento de cocção, maior capacidade de retenção de água e menor encolhimento nestes. Melo e Clerici (2013), trabalhando com substituição de gordura por farinha desengordurada de gergelim em hambúrgueres, observaram aumento do rendimento e da diminuição do encolhimento nos produtos adicionados da farinha. Oliveira et al., (2014) que utilizaram linhaça dourada como substituto de gordura animal em hambúrguer encontrou que quanto maior a adição de farinha de linhaça dourada, maior foi o rendimento e a capacidade de reter água. Estes resultados podem ser explicados devido as fibras que compõem estes substitutos terem boa capacidade de reter água, que acarreta em maior rendimento e consequentemente menor encolhimento.

Logo, a farinha de casca de maracujá devido a sua grande quantidade de fibra alimentar, 66,37% (SOUZA et al., 2008), aumenta a capacidade de retenção de água, diminui o encolhimento dos hambúrgueres e, consequentemente, contribui para melhor o rendimento da cocção, gerando menores perdas para as indústrias e melhor aceitação deste tipo de alimento pelos consumidores.

Acredita-se que o público que consumiria este hambúrguer com teor reduzido de gordura pela adição da farinha da casca de maracujá seja aquele consumidor que opta por opções mais saudáveis de alimentos sem abrir mão do prazer de comer e da praticidade na hora de preparar e consumir uma refeição. Esse perfil de consumidor até paga a mais nesses alimentos quando percebe o valor agregado que procura. Apesar de que o custo de produção deste hambúrguer proposto não deverá onerar tanto com a substituição da gordura pela farinha da casca de maracujá, uma vez que esta pode ser proveniente de material que seria considerado resíduo industrial da produção de suco. Onde, a casca corresponde a aproximadamente 60% do peso do fruto e constitui-se de um tecido esponjoso de fácil desidratação que pode ser reaproveitada para obtenção da farinha. (ASCHERI et al., 2013).

Os resultados da Análise de Perfil de Textura (TPA) são mostrados na Tabela 4.

Tabela 4. Perfil de Textura (TPA) para os diferentes tratamentos de hambúrguer

Tratamento

Dureza (N)

Elasticidade (-)

Coesividade (-)

Mastigabilidade (N)

Padrão*

30,71±9,21 a

0,90233±0,02 a

0,85017±0,02 ab

23,44±6,48 ª

50%*

35,91±15,95 a

0,89967±0,03 a

0,86383±0,02 a

27,42±11,27 ª

100%*

41,85±11,4 7a

0,87650±0,01 a

0,839±0,01 b

30,79±8,45 ª

*Padrão: formulação sem adição de farinha da casca de maracujá, 50%: formulação com substituição de 50% da gordura bovina por farinha da casca de maracujá, 100%: formulação com substituição total da gordura por farinha da casca de maracujá. Médias seguidas de mesma letra na mesma coluna não diferem pelo teste de Tukey (p>0,05).

No quesito dureza, não houve diferença significativa (p<0,05) entre os tratamentos, logo a força requerida para a compressão do hambúrguer entre os dentes molares foi igual para todas as amostras. Do ponto de vista sensorial isso é muito importante, pois provavelmente a substituição da gordura não provocará alteração na percepção da maciez do produto pelos consumidores, ademais o aumento da umidade nas formulações onde se substituiu a gordura pela farinha da casca de maracujá poderá ser associada a maior suculência e maciez pelo provador. Com relação à elasticidade, observou-se que não houve diferença (p<0,05) para os diferentes tratamentos, sendo todas as amostras elásticas e tendo a mesma resistência para voltar a forma original após a compressão. Trevisan et al. (2016) também não observaram diferença significativa (p<0,05) para estes parâmetros quando comparou formulação de hambúrguer padrão, com adição de gordura, e outras no produto no qual esta foi substituída por farinha de aveia.

Com relação ao atributo coesividade, que é o quanto a amostra é comprimida antes de romper, não houve diferença dos tratamentos 50 e 100% de substituição para o tratamento padrão. Isso mostra que, para este quesito, a adição da farinha da casca de maracujá não diferencia o produto de um tradicional. Entretanto o tratamento entre 50 e 100% diferiram entre si, revelando-nos que o teor da substituição pode alterar a coesividade do produto.

Mastigabilidade refere-se ao tempo requerido para mastigar uma amostra, a uma velocidade constante de aplicação de força, assim quanto menor a dureza menor será a mastigabilidade. Esse fator pode ser influenciado pela presença de gordura nas amostras (DUTCOSKY, 2013). No presente trabalho, não houve diferença (p<0.05) entre os tratamentos, logo a mastigabilidade estava de acordo com o atributo dureza e acrescenta-se o fato de que a remoção da gordura não impactou este parâmetro, o que pode ser considerado ponto positivo em uma avaliação sensorial.

Portanto, quanto ao perfil de textura, o que notou-se no presente trabalho foi que as substituições de gordura não provocaram diferença na mastigabilidade e nem na dureza, a qual representa um dos parâmetros mais importantes da textura de produtos cárneos, influenciando a preferência do consumidor (HUANG et al., 2011). Outros trabalhos com substitutos de gordura, mostraram interferir nestes parâmetros, como reportado por Novelo (2011) em seu trabalho que observou que a adição de farinha e de semente de linhaça dourada causou diferença em relação a esses atributos quando comparados ao tratamento controle.

Por fim, em relação à coesividade, houve diferença entre o tratamento 50 e 100%, apresentando diferença entre a energia gasta na compressão dos hambúrgueres.

Destaca -se que emprego de métodos instrumentais para a avaliação da textura vem sendo amplamente estudado, principalmente devido à facilidade e simplicidade de padronização em relação à utilização de painéis sensoriais treinados (SZCZESNIAK, 2002).Entretanto, é importante ressaltar que a impressão sensorial do consumidor é fundamental para a escolha de um produto alimentício, pois há outros parâmetros sensoriais, como o sabor, o aroma e a aparência, que também podem contribuir para essa escolha. Assim, para trabalhos futuros vale a sugestão da realização de análise sensorial.

CONCLUSÃO

As formulações de hambúrguer com substituição parcial e total da gordura por farinha da casca de maracujá contribuem para o aumento do rendimento de cocção e para redução do encolhimento no hambúrguer bovino. Isso reflete a obtenção de um produto mais saudável pela redução do teor de gordura e incorporação de fibras e com propriedades que vão permitir um produto com menores perdas para as indústrias.

Todas as amostras estavam dentro do padrão estabelecido pela legislação para proteína e para gordura. Ressalta-se o fato de a formulação com substituição total poder ser rotulada como “baixo teor de gordura”, que é uma característica buscada por consumidores, portanto permite a agregação de valor ao produto.

A adição da farinha da casca de maracujá hambúrguer bovino não interferi na dureza, na elasticidade e nem na mastigabilidade do produto.

A farinha da casca de maracujá é uma promissora alternativa na substituição da gordura em hambúrguer, permitindo a obtenção de um alimento mais saudável além de promover o aproveitamento de resíduos de outras indústrias alimentícias.

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